É tão animador quanto relevante um livro do escritor escocês Robert Louis Stevenson (1850-1894) que trate sua obra de uma forma devidamente adulta. Devido à narrativa cristalina e às histórias de teor fantástico ou aventuresco, Stevenson ainda carrega, em alguns meios, a pecha de autor infantojuvenil e adequado só a bancos escolares. Nada mais falacioso. O lançamento de “O Clube do Suicídio e Outras Histórias” pela Cosac Naify pode colocar Stevenson numa posição mais justa ao seu gênio.
Para além da seleção de seis precisas histórias do autor, a edição (publicada dentro da coleção Prosa do Mundo) dá tratamento de luxo ao escocês, com a inclusão de um amplo prefácio de Davi Arrigucci Jr. e dois artigos fundamentais sobre Stevenson – um, mais geral, do norte-americano Henry James e publicado em 1888 numa revista; e outro, do russo Vladimir Nabokóv, a partir de uma aula de 1980, que versa especificamente sobre a mais famosa criação de Stevenson, a novela “O Estranho Caso de Dr. Jekyll e Mr. Hyde”.
Esta é, aliás, a sempre grande atração de qualquer antologia de Stevenson. Publicada pela primeira vez em 1886, a novela ficou mais conhecida no Brasil como “O Médico e o Monstro”, ainda que esse título seja uma liberdade poética bastante redutora ao teor da história.
“O Estranho Caso de Dr. Jekyll e Mr. Hyde” é apenas outro demonstrativo do talento literário de Stevenson – também confirmado especialmente no conto “Markheim” e nas três partes distintas da novela “O Clube do Suicídio”. Arrigucci cita o poeta inglês John Keats para definir a mágica proporcionada pelo autor: “Aquilo que a imaginação capta como beleza deve ser verdade”. Logo em seguida, o próprio prefaciador completa o raciocínio, caracterizando a prosa do escocês como a mistura entre “a imaginação que inventa histórias parecidas aos sonhos e a aguçada sensibilidade visual”.
Por mais que Stevenson fale de crimes, duplas personalidades, suicidas, assassinos, cadáveres ambulantes, encontros com o demônio e ação em alto-mar (ele é autor do romance “A Ilha do Tesouro”), o escritor sempre narra os limites da natureza humana diante de situações de profunda complexidade moral e mesmo científica – o que, à sua maneira, o aproxima de nomes como Jorge Luis Borges e Dostoiévski.
Adaptações
“O Estranho Caso de Dr. Jekyll e Mr. Hyde”, a mais famosa e referencial história criada por Robert Louis Stevenson, entrou para o inconsciente coletivo de tal forma que é impossível alguém não saber do que a trama fala.
Na TV e no cinema, são mais de 120 adaptações desde o início do século passado (a primeira é de 1908, feita pelos estúdios Selig). Para teatro e rádio, perdeu-se a conta. Há ainda as versões indiretas, que se utilizam do enredo básico da novela para desenvolver uma história própria.
Na TV, é o caso de algumas animações famosas protagonizadas pela dupla Frajola e Piu-piu, nas quais o doce bichinho amarelo se torna um monstro selvagem; e, nos quadrinhos, Stan Lee provavelmente se inspirou em Stevenson para criar o Hulk – e seu alter ego, o cientista Bruce Banner.
Até os Trapalhões fizeram a sua versão, em 1980, na comédia “O Incrível Monstro Trapalhão”.
O CLUBE DO SUICÍDIO E OUTRAS HISTÓRIAS
Editora Cosac Naify
O CLUBE DO SUICÍDIO E OUTRAS HISTÓRIAS
Editora Cosac Naify
500 páginas
Tradução de Andréa Rocha
R$ 66
*Publicado em "O Tempo" no dia 17.9.2011
*Publicado em "O Tempo" no dia 17.9.2011